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SURFARI 10 ANOS

Atualizado: 28 de set. de 2023



PARTE 01/10



Lucas Zuch teve uma ideia. Era uma tarde ensolarada no inverno de 2012 em Porto Alegre. Acho que era Junho. Tanto eu, como Zuch, trabalhávamos em um centro comercial dos mais corporativos e caretas que se pode encontrar na cidade, bem ali no cruzamento da Av. Carlos Gomes com Nilo Peçanha. Marcamos um almoço no Banx, que era um dos primeiros restaurante/bar/skatepark do país. Lucas queria me apresentar uma proposta. Já éramos conhecidos desde o terceiro ano do colégio, onde não criamos nenhuma intimidade. Nos tornamos grandes amigos desde uma viagem para Australia em 2008, em que andamos por mais de 10mil km em um verdadeira surf safari por quase toda costa australiana.

Sentamos para comer. Lucas de terno, no intervalo de almoço do seu emprego em uma corretora de investimentos e eu, de camisetinha polo, vestimenta adequada para quem já completara três anos como estagiário de uma empresa de pesquisa de comportamento de consumo.

Ambos estávamos prestes a nos formar na faculdade;

ambos seríamos oradores das suas turmas;

ambos estávamos afim de largar nossos empregos;

ambos queríamos usar mais a nossa criatividade no trabalho;

ambos achávamos que era possível dar um jeito de trabalhar com o surfe.


Lucas gostava de escrever e já tinha um blog junto com outro amigo, o Gueto: www.Surfari.com.br (domínio que havia sido registrado pelo visionário Tio Dado). Até então, o blog não era levado com um business, mas como um depositário de toda expressão criativa e os aprendizados que tinham com o surf. Roteiros de viagens, sessions, reviews de livros. Etc. Mas como eu disse: Lucas teve uma ideia e me chamou, pois também tinha uma proposta.


A ideia: Reformular o blog e torná-lo um portal de conteúdo de surf com maior profundidade. Trazendo tutoriais para surfistas, receitas de comidas, reviews de livros, filmes, viagens e surftrips. Tudo aquilo que aprendíamos com os surf safaris da vida, apresentados com fotos e vídeos. COMO GANHAR DINHEIRO COM ISSO? buscaríamos clientes que gostariam de estar presentes naqueles conteúdos. (Queríamos fazer, Branding content, mas ainda não conhecíamos o termo.)


A proposta: 5K reais de investimento inicial, dedicação total para a firma, criar um CNPJ e começar a produzir para aumentar os acessos.


Confesso que me assustei com a apresentação da proposta. Uma folha A4 amassada, com a lista de objetivos ajustados ao centro sem nenhuma ordem hierárquica ou um plano estratégico. Mas Zuch nunca foi um cara muito bom com coisas visuais. O papo era bom, vinha do coração e ele tinha brilho nos olhos. Eu aceitei a proposta.


Zuch tinha acabado de apresentar uma pesquisa de conclusão de curso na sua faculdade. AS CARACTERÍSTICAS PSICOGRÁFICAS DOS SURFISTAS DE PORTO ALEGRE. Um trabalho nota 10, que 10 anos depois já serviu de base para centenas de outras pesquisas sobre o tema. Aquele documento era nossa pedra filosofal que embasava o nosso início de negócio.


Depois de 6 meses apresentando a firma por aí em busca de alguns investidores (sem sucesso) decidimos transformar as conclusões do TCC do Lucas em um vídeo para o lançamento de nosso portal remodelado. O vídeo manifesto se chamou reconhecendo o Surf e foi apresentado para o grande público no evento Mostra Surfari Australia dia 13/12/2012, no Instituto NT em Porto Alegre.


O evento traduziu um pouco do que queríamos: um monte de amigos ajudando a produzir, uma mostra de fotos, uma estreia de filme nosso, uma exibição de filme da nossa principal referência estética (kordutoy.tv) na sala de cinema e uma galera reunida celebrando a cultura surf. Um belo exemplo sobre o que seriam os próximos 10 anos.




PARTE 02/10



O Manifesto reconhecendo o surf foi um sucesso. Nossa página do Facebook vinha crescendo para além do nosso grupo de amigos, produzíamos alguns conteúdos com alto engajamento, como fotos inspiradoras, entrevistas com pessoas interessantes, postagens interativas como o “guess the spot”, mas os 5 mil seguidores que alcançamos em Junho de 2013, não se traduziram em pila$ na nossa conta. Munidos com duas Canon T3i e Iphones 5 recém comprados (nossos primeiros smartphones), começamos a filmar tudo que estava em nossa frente. Surf era sempre o objetivo, mas morando a 200 km da praia tínhamos que ser um pouco mais criativos.


Pra fazer dinheiro começamos então a ter nossos primeiros clientes audiovisuais. Apresentamos uma proposta ousada de uma websérie para a GAP genética, empresa rural da minha família. (Ousada pois até então quase nenhuma empresa no setor se aventurava com conteúdo focado para internet) Depois dessa websérie, começamos a cobrir em vídeo vários eventos da AmCham através do grande amigo @pedrovalerio que depois veio a ser nosso conselheiro. Na base do Do it Yourself começamos a erguer nossa estrutura para produção audiovisual. Slider, shoulder rig, cage.. tudo feito à base de canos de pvc e cola.


Contratar nossos serviços de produção de vídeo não era muy caro, e cobrávamos ainda mais barato dos clientes que sonhávamos em ter: Através da Void (Kiko hein) fizemos um teste ride de pranchas para Rusty, uma cobertura do Red Bull skate Generation em Florianópolis e o cobrimos o Mimpi FIlm Fest na sua primeira edição. (Este último evento foi um alento. Um forte incentivador pra que a gente continuasse perseguindo nosso sonho)


Na parte autoral, perdemos as contas de tantas reuniões já fizemos pra tentar vender projetos relacionados ao surf que nunca saíram do papel. Em uma delas, tentamos vender branded content para uma viagem de Zuch para a Califórnia, onde faria uma dúzia de entrevistas, entregaria fotos e culminaria em um evento cultural no final do ano. Conseguimos uns pilas, mas que não bancavam nem todos os custos da trip. Ele foi mesmo assim. Éramos dois jovens bem intencionados, cheio de brilho no olho, mas com poucos argumentos que realmente faziam sentido para convencer um patrocinador/investidor. “O bolso que fica a carteira está muito longe do coração” disse certa vez outro de nossos conselheiros. Mesmo assim fizemos fizemos boas empreitadas no amor, entre elas estava filmar incontáveis shows e ensaios dos nossos parceiros músicos. Good Samaritans, Viralataz, Samba e Amor… Nesse ano nasceu o Festival Caminhos Livres e com ele aprendemos que temos amigos e parceiros suficientes para produzir eventos maiores.


Viámos empreendedores da mesma geração começar a prosperar devagarzinho. Oaks, Odara, Brasco, Steal the look… Todos eram amigos pessoais/conhecidos que trocávamos infos sobre as barreiras de quem estava começando algo do zero. Apesar da proposta de valor do Surfari nunca ter sido muito clara, sabíamos que precisávamos escalonar nossos ganhos. Relutávamos com a ideia de nos tornar uma produtora audiovisual (chamávamos os nossos jobs de trabalho sujo, para bancar o sonho) e nos viámos mais no caminho de uma marca de surf mesmo. Assim, lançamos nossa primeira coleção de camisetas enroladas em uma embalagem semelhante a um rocambole (SURFARI GEAR 01) durante o evento de encerramento do ano. Mostra Surfari Califórnia. Esse evento foi o primeiro a nos dar lucro de verdade, vendendo algumas cotas de patrocínio e muitas cervejas.


Continuávamos a produzir bastante conteúdo de rápida absorção para nossa página de Facebook, nossa fan base estava crescendo mas nosso o Surfari ainda era “literalmente” muito caseiro. Ainda estávamos trabalhando no meu apartamento, tínhamos regras claras e severas escritas em uma folha A4 e coladas na parede: “aquele que atrasar a entrega de um trabalho, deve pagar o outro sócio com uma torrada”. Kkk


No final de 2013 decidimos alugar uma sala comercial. O custo fixo seria o nosso melhor coach motivacional.


PARTE 03/10



Saímos da sala do meu apartamento e alugamos uma pequena sala comercial na rua Barão do Amazonas. Como um dos pilares do Surfari na época era o DIY, fizemos questão de colocar a mão na massa para ajeitar a sala. Mais uma vez uma leva grande de amigos nos ajudaram a deixar tudo pronto (Andrya, Ranieri, Brandão, Lucas Saporiti, Ogro, Tusi, Renan) . As tarefas eram cerrar os OSBs, fazer carretos de mesa, pintar a parede e por aí vai. Fizemos vídeo autoral contando essa pequena epopeia. “Surfari headquarters”, que depois de ser repostado por vários blogs/páginas, (tipo os hypeness, brainstorm9 da vida), foi considerado por nós como o nosso segundo “viral”. Naquela sala contratamos nossos primeiros estagiários. Cassio Cappellari e depois Amanda Oshida.


No início de 2014, o Surfari foi convidado a participar do MECA festival como uma das marcas que era responsável por criar experiências para o público nos “clubinhos”. Eu, Cassio, Kiko e Arthur estreamos o novo barracão da firma em uma proposta “praia no lago” do festival. A ideia era boa, mas a tempestade que caiu foi com certeza a experiência mais marcante. Enquanto isso Lucas embarcara em uma viagem para a França em uma parceria com nosso primeiro cliente audiovisual da história, a Freeboard. Junto com ele os então sócios Martim e Maestri. Dessa viagem surgiu a websérie “Surfari na Neve”, mostrando os primeiros passos de um surfista se arriscando no snowboard. Ali quebramos uma barreira importante nas nossas mentes: colocar a nossa cara nos conteúdos autorais dava engajamento e fortalecia a marca mais do que qualquer coisa. Lançamos a websérie com um evento, pois já tínhamos aprendido que fazer festinha dava dinheiro.


Não tanto dinheiro quanto às produções audiovisuais para aquém do mundo do surf. Seguíamos produzindo reviews de eventos corporativos para a Amcham e para a GAP. Reinvestíamos nossos ganhos em equipamentos e trocamos as duas Canons t3i, por duas Canons 6D. Belo upgrade. Continuávamos cobrando menos de clientes que tinham a ver com nossa proposta e brincávamos que esse era nosso trabalho de Robin Hood, nos sentíamos nobres cavalheiros batalhando por uma maior relevância do surf na nossa cidade. Assim, filmamos o evento Madeirite, fizemos uma matéria para a Surfers Journal sobre o projeto Rekombinando, ajudamos a montar e divulgar o Caminhos Livre 2, que juntou mais de 3000 pessoas em uma praça pública. Nossa gama de amigos e parceiros não parava de crescer, o Zuch era um gênio na arte de fazer novas amizades e eu sempre me esforçava para fazer estes rirem (mesmo sem nunca lembrar o nome de ninguém)


Porto Alegre na época recebia a Copa do Mundo e nós, na flor da idade (23 anos) tínhamos acabado de ficar solteiros de uma forma coincidentemente sincronizada. Nossas antigas namoradas nos ajudaram muito até ali. Cabe um grande agradecimento à elas: Gabi, que escreveu diversos textos para o blog e ajudava em todos eventos que fizemos até aquele ano, e Bruna, que redesenhou a maravilhosa marca do Surfari na versão que ela está hoje, fez o site da época e refinou toda demanda de design gráfico que tínhamos.


Depois de solteiros, TODOS os finais de semana íamos para a praia. Nessas 4 horas de ida + 4 horas de volta, tivemos a ideia de fazer um telejornal que comentaria os acontecimentos do mundo do surfe. Assim nasceu o Surfari na Semana Passada, show itinerante que teve mais de 50 episódios. Estávamos criando mais intimidade com as cameras, seja filmando, entrevistando, falando ou até atuando. Nesse embalo materializar qualquer ideia maluca, surgiu a sátira do recém formado Canal Off (o tipo Off) e a loucura maior de todas (O surf Criollo). Produzíamos muito. Ganhávamos quase nada. Os custos fixos limitavam qualquer possibilidade da empresa crescer desse jeito e não conseguimos manter nossos queridos estagiários. Mas de vez em quando surgiam uns trabalhos que nos dava um alento.


Fomos contratados pelo Mimpi para fazer as vinhetas e a cobertura em vídeo do Festival que agora desembarcaria no RJ. Nos ofereceram os tickets aéreos mas optamos por uma ajuda na gasolina. Nosso fiel escudeiro Thomaz embarcou conosco nessa e fizemos mais um Surfari épico de POA até o Rio, trecho que até então não conhecíamos. Por lá conhecemos muita gente, algumas referências no meio do surfe e pessoas que viriam a se tornar grandes amigos em um futuro próximo. O resultado disso tudo é o décimo episódio dos Surfari na semana passada.


Fechamos o ano com dois desafios: o primeiro era repetir a tradição de escolher um destino e fazer o nosso aniversário anual. Assim surgiu a Mostra Surfari Uruguai, com uma rica competição interativa entre “barcas” que deveriam ir lá no país vizinho e registrar seu Surfari. Prêmios gordos foram entregues aos campeões e boas parcerias surgiram naquele evento. Com a Ambev através do gigante Índio, com a Art in Surf do querido Arthur, com a Odara do Jeison e com uma penca de amigos que nos ajudaram a fazer outra baita festinha.


O outro desafio era concluir nossa relação com o cliente comercial Amcham com um vídeo épico. Pedro Valério nos estimulou a fazer uma relação entre o mundo do surf e o mundo do business. Voltamos para o escritório da Barão do Amazonas e começamos a escrever cada um no seu computador. Juntamos um pouco de cada texto e criamos o manifesto Every CEO should surf. Tínhamos mais um viral no portfólio, tínhamos uma boa base de seguidores, know how de como fazer evento, parcerias com marcas legais, uma marca própria já com alguns modelos de roupas nada convencionais e seguíamos com brilho nos olhos. Era hora de crescer!


PARTE 04/10





O final de 2014 foi um marco pra todos que trabalhavam com surf no Brasil. Medina acabara de ganhar o mundial e uma porteira acabou se abrindo para uma, ainda pouco falada, Brazilian Storm. Mas de repente todos falavam de surf: minha vó, o taxista, o frentista, o William Bonner… O surf, finalmente, tinha um herói nacional. Comemoramos muito, pois sabíamos que aquilo ajudaria nos nossos planos de ganhar a vida em meio a “indústria do surf”. Quase um mês depois desse acontecimento, o único profissional de renome internacional que tínhamos contato acabou sendo assassinado. Ricardo dos Santos foi um baque pra nós, além de ser um baita surfista obviamente, ele nos inspirava muito na forma megalomaníaca de pensar e fazer negócios.


Mesmo assim estávamos otimistas pois as sementes plantadas nos anos anteriores estavam começando a florescer. Nossa base de seguidores crescia bastante e o público nos eventos também. As roupas já vendiam bem apesar na nossa falta de organização com custos e estoque. No conteúdo autoral o nosso roadshow semanal Surfari na Semana Passada tinha sempre umas 2mil visualizações por semana, nada muito relevante, mas no nosso círculo social os elogios/críticas estavam na boca do povo. Com os contatos que fizemos no Mimpi começamos a explorar mais o litoral Catarinense, de Garopaba até Joinville, conhecemos até nossa maior referência no surf-humor: um tal de André Zanini (Zana Hickel). Outros programas surgiam no nosso canal de Youtube: “mão na massa” com tutoriais de DIY e o “Mangiare” com receitas. Contratamos um talentoso jovem (namorada da minha prima na época) pra nos ajudar a editar esse tipo de conteúdo @flashbecker, que com apenas 18 anos sabia editar mais ou menos, mas desde cedo mostrou que era uma “esponja” na hora de aprender. Aos poucos ele imprimiu uma identidade própria nos conteúdos que nos ajudou muito.


Ha algum tempo, Zuch vinha falando com o Ogro (shaper de Porto Alegre que nos apoiou e incentivou desde o dia 1) sobre a reforma que ele estava fazendo em um antigo galpão no quarto distrito de Porto Alegre. Os CoWorkings estavam pipocando pela cidade mas a ideia do Studio Floresta era diferente: reunir pessoas com interesses em comum para trabalhar juntos. Ali estariam os representantes da Vans no Estado (e a marca própria Yerbah), entre outros talentos que se tornariam grandes amigos. Ogro estava nos convidando pois via em nós o potencial de somar naquela mistura cujos pilares eram o surf, skate, DIY e necessidade de amplo espaço para trabalhar. Vimos no Floresta uma baita oportunidade colocar nossas ideias em prática e decidimos nos mudar. Como sempre, um batalhão de amigos nos ajudou nessa função.


Logo no início do ano também contratamos a Deia Sabino. Ainda sem muito cargo definido, ela ajudava o Zuch em tudo o que ele não estava mais dando conta. Organização da firma, registro dos clientes, planejamento editorial… Estávamos atuando em três pilares: GEAR (Confecções), EVENTOS e MEDIA e a Deia ajudava um pouco em tudo. Apesar de ainda haver demanda, os vídeos institucionais para empresas fora do surf foram perdendo prioridade na pauta, com exceção da GAP que era da minha família e eu não sabia dizer não kkkk) como consequência disto nossa conta bancária também não andava muito saudável. Alguns trabalhos feitos para a rede de Lojas Trópico e a Mormaii eram bons indicadores de que nossa identidade criativa já estava tendo alguma aderência com empresas do meio do surf. Considerando que na época o mercado que pagava “infliuencers/youtubers” era muito incipiente, estávamos abrindo um mato na base do facão mesmo.


Considerávamos que o GEAR seria nossa principal fonte de receitas em pouco tempo, por isso decidimos aumentar o time. Paulinho e Ranieri, que há muito tempo já nos ajudavam de N maneiras, vieram oficialmente reforçar o Surfari. Dar vazão nos produtos não era fácil. Nossa linha de produtos pouco ortodoxa vendia desde mochilas impermeáveis, canivetes, cuisas, livros até ponchos e capas de pranchas. Tudo feito, embalado e enviado de maneira um tanto quanto artesanal. Os eventos sempre ajudavam a escoar um pouco da produção mas quando fechávamos as contas no final de cada festinha, a cerveja vendida sempre acabava pagando maior parte da conta.


No meio do ano realizamos o sonho de ir pra Indonésia em uma boattrip. Aproveitamos a viagem de várias maneiras para produzir conteúdo, fotografar as roupas e até fazer campanha para a Trópico. O pagamento desta viagem foi um dos primeiros bônus que a empresa deu para os sócios. A felicidade foi imensa e a temática da Mostra no final do ano já estava decidida.


Quanto mais conhecíamos outros surfistas pelo mundo e pelo Brasil, mas entendíamos que a nossas peculiaridades como praticante desse era bem única. O mate, as horas de estrada, o frio, o assado, o gauchismo… não éramos tão bons surfistas mas nosso espírito guerreiro de ir em busca das ondas era admirável. Nossa linha de confecções tentava traduzir um pouco isto também. Decidimos que no dia do Gaúcho faríamos um baile/festa para comemorar essa identidade, unindo a cultura gauchesca com a cultura do surf. Para divulgar a festa pensamos que seria engraçado se no cartaz, o laçador (estátua símbolo do RS) tivesse com uma prancha embaixo do braço. Levamos essa ideia um pouco mais a sério e acabamos parando na capa do jornal e dando entrevista para todas principais rádios do Estado. Mais tarde descobri que na publicidade chamam isso de “stunt”. Nossa stunt foi muito bem sucedida e o evento foi um sucesso. O evento também marcou nossa primeira parceria com a cerveja Corona, que acabara de começar suas vendas no Brasil e via nas nossas festinhas (que agora aconteciam com certa regularidade no Studio Floresta) uma boa oportunidade para estar juntos.


Estávamos ficando bons em promover eventos e reunir pessoas. Na produção de mídia tínhamos consistência embora o número de visualizações não era um argumento suficiente para vender branded content. Nos produtos, mantinha-mos um bom fluxo de caixa e o estoque finalmente estava um mais organizado. O tripé estava funcionando e até resolvemos chamar mais um talento pra nos ajudar a editar vídeos. Bolivar Gelpi, que já era nosso amigo dos rolês musicais, se juntou ao time.


Fomos para o Rio mais uma vez para participar do Mimpi e levamos até o estagiário kkk. No dia que começaria o festival saímos de barco para as Ilhas Tijucas e acabamos naufragando junto com nossa mochila inteira de equipamentos. Uma experiência bem marcante na nossa existência, um talagaço bem caro para uma empresa que faturava pouco. Meio de luto pelas câmeras, vivemos o festival do jeito que deu. Pra nossa sorte o friozote carioca nos ajudou a vender nossas roupas mais invernais (a única marca do festival que tinha esse tipo de produto no mix da barraca kkk). Um grande salve pra família Witt que nos recebeu sempre com muito carinho por lá e para o Bruno Cunha que nos salvou durante os dias de evento emprestando um kit mate. Mais tarde essas conexões ficariam ainda mais fortes


Pra fechar o ano no nosso aniversário de 3 anos, A Mostra Surfari Indonésia foi um sucesso! De público, de críticas e de faturamento. O time de amigos que nos ajudava atendendo no bar e no caixa parecia se divertir muito e sabíamos que poderíamos contar com eles para planos maiores. Tínhamos vontade de lançar nosso primeiro campeonato de surfe. Mas ele tinha que ser diferente.


PARTE 5/10





Antes mesmo de começar, o ano de 2016 prometia fortes emoções. O Surfest já vinha tomando conta da pauta e ia se desenhando um evento de enormes proporções, envolvendo uma força tarefa de fornecedores muito além da nossa empresa. Em paralelo a isto, há algum tempo vínhamos sonhando em produzir um documentário sobre as nossas peculiaridades identitárias como surfistas, que batizaríamos de Ilex Surfers, uma referência ao nome científico da erva mate (Ilex Paraguariensis) aplicado a um rito cultural que nos unia a Uruguaios e Argentinos em um só país imaginário. Essa viagem toda veio depois de nos aprofundarmos musicalmente em artistas do RS e do Uruguai e assistirmos ao documentário “A linha fria do Horizonte”. Um desses músicos gaúchos que vínhamos escutando bastante e virou nosso amigo, Zelito Ramos, nos disse que haveria uma espécie de festival espontâneo em uma praia uruguaia durante o aniversário de Daniel Drexler, o irmão de Jorge e, que a família toda é surfista e adoraria nos receber. Eu e o Zuch que de tanto andar juntos já éramos reconhecidos como o “casal Surfari” kkk, fomos para o Uruguay já nos primeiros dias para viver essa imersão musical. Aproveitamos para entrevistar Daniel e seu tio Chiquito Prada, um dos primeiros surfistas do Uruguai. Estava nascendo ali mais um ótimo projeto que acabou ficando na gaveta. (Nesses 10 anos, uma frase muito falada na firma foi “mais vale um projeto bom na rua, do que um ótimo na gaveta. O excesso de preciosismo sempre foi nosso inimigo.)

Mas nessa viagem também aproveitamos para gravar alguns do músicos que estavam ali e começamos um outro programa no nosso canal de Youtube, o Flat Day Songs, selando definitivamente nossa forte intenção de também trabalhar com a cena musical. Apesar de ter 0 ritmo, Zuch estava sempre escutando músicas, atualizando playlists e explorando “as descobertas da semana”, no recém descoberto Spotify. É importante situar que neste início do ano de 2016, o Snapchat era a rede emergente e o Instagram, que ainda não tinha a função stories, tinha um feed com mais fotos do que vídeos.

Ainda voltaríamos ao Uruguay no Carnaval acompanhando os Good Samaritans em sua primeira turnê internacional para tocar em Punta Del Diablo. Um bate volta muy festivo, pois dali em duas semanas teríamos que colocar um, nada discreto, Surfest de pé. Nosso time estava entrosado. A produção de conteúdo soltava no Youtube uns 2 vídeos por semana no mínimo. As roupas, seguiam vendendo na capitania do Paulinho e do Ranieri, e estávamos armando uma coleção de inverno finalmente com a antecedência necessária.

O Surfest mereceria um capítulo à parte. Talvez o festival tenha em seu gênesis os Colegiais de surf lá nos anos 2004/5/6 que tinham disputas entre equipes de cada colégio, ou talvez a referência principal esteja no M/E/C/A Festival quando ainda era um campeonato de surfe/festerê na beira da praia da Atlântida.

Fato é que, tanto eu como o Zuch como quase todos nossos amigos, éramos surfistas médios (pode-se também dizer medíocres) e nunca existiu um campeonato de surfe que pudéssemos participar sem passar vergonha. O Surfest era a chance de valorizar mais a amizade e a camaradagem do que a performance em si. Outra coisa que nos incomodava em campeonatos de surfe tradicionais, é que a praia vai ficando vazia à medida em os atletas vão perdendo. O Surfest já partia do princípio que todo competidora parte de uma equipe e, consequentemente, uma torcida que ficaria lá gritando até o final.

Um campeonato entre barcas, divididos nas categorias de performance + monoquilha + fotografia + surf à fantasia. Para colocar essa ideia de pé, fizemos um esforço que começara uns 4 meses antes, quando organizamos um churrasco para mostrar a possíveis investidores a nossa ideia, apresentada em um vídeo com direito a uma viagem 3D (gracias eternas Hub Arquitetura) pela praia mostrando o posicionamento que cada barraca, cada patrocinador, palanque, ativações de marca e deixando clara a dinâmica do festival. Nunca tínhamos nos dedicado tanto para um projeto. Tinha que dar certo. A cerveja Corona foi a primeira e entrar como patrocinadora. Depois veio Prefeitura de Atlântida, alguns vários apoiadores e por fim um grande patrocínio da Corsan. Ficamos tão empolgados que gastamos até mais do que devíamos chamando um atração dos sonhos: “Fechou Corsan… Chama o Tonho Crocco”.


Soma-se a esse esforço comercial, um enorme apreço à estética do festival. Fizemos mais de 90 bandeiras para tremularem no vento de Atlantida como se fosse um paradouro Uruguaio, fizemos diversas reuniões com nossos parceiros da 303 design para chegar na Identidade visual ideal, cortamos bambus, desenhamos um palanque + palco para centralizar a experiência e contamos com uma mãozinha da Planosom para que tivéssemos “caixas de som suficientes para derrubar a plataforma se a gente quiser” (Fala do próprio Nando, dono da Planosom) e um telão, pois seria interessante para a competição das fotográfica.

A equipe de produção de vídeos parou as produções rotineiras do Youtube para dar uma mão no festival também. Precisávamos explicar a proposta do festival, explicar as regras, a vibe, os serviços, mostrar os patrocinadores e criar uma espécie de clima de competitividade entre as barcas. Como já era de praxe, mergulhamos fundo em ideias às vezes bem absurdas. Um final de semana antes do festival fomos para a Atlantida para fazer um meio de campo com os locais. Teríamos uma categoria dedicada à eles e resolvemos filmar um aquecimento para já ir trocando ideias e deixando todos imbuídos da proposta do próximo sábado.


De noite fomos no Bar 1 (complexo notívago já carimbado da região) para tomar uma gelada e espalhar um pouco mais a ideia do festival aos amigos. Chovia muito. Um dilúvio. Tanto que abriram o Bar 1, 2 e a Pista 3 para melhorar o fluxo. Era uma noite qualquer, até que cruzei o olhar com uma menina mui charmosa, vestida de maneira nada convencional para o ambiente. Não usava salto, pouquíssima maquiagem e os cabelos negros escorridos revelavam o rosto quase oriental emoldurados por uma franja estilo francesa dos filmes da Nouvelle Vague… ta bem.. viajei aqui.. mas esse olhar teria um forte efeito no meu futuro…

Enfim o dia ia se aproximando com uma previsão do tempo caótica. Meio temporal, meio terral, meio sol.. sem vento. Era inacreditável o que os gráficos mostravam. O sábado ia se desenhando perfeito mesmo com uma pequena ameaça de chuva. A montagem do festival ia acontecendo em meio a uma neblina que anuncia o sol que está por vir. As mais de 90 bandeiras cravadas em mastros de bambu sequer se mexiam. As ondas estavam lá, meio metrão na série, textura perfeita, canal funcionando embaixo do píer. Que sorte!!! A sorte vem pra quem trabalha, não necessariamente nessa ordem. Naquele dia de sorte, trabalhamos muito. Aos amigos que formaram aquela baita equipe do Surfest um eterno MUITO OBRIGADO.


“O melhor dia da minha vida” foi um Feedback comum que recebemos de pessoas de todo o tipo, surfistas ou não. Nada poderia ter nos deixado mais feliz. Mas ainda estávamos em Fevereiro e o ano prometia outro grande projeto. Vender cerveja vinha dando dinheiro, mas estávamos nos distanciando do nosso Core. Queríamos voltar a nossa pedra filosofal, aquele primeiro projeto de pesquisa que lançamos do dia 13 de Dezembro de 2012. O reconhecendo o surf era uma pesquisa sobre os surfistas de Porto Alegre, que muitos surfistas de outros lugares usavam para “vender” o surfe. Se a gente atualizasse ela, aplicada à todo o Brasil?


PARTE 6/10





E se a gente atualizasse a pesquisa de 2012, aplicando-a “in loqum” por todo Brasil?


Essa pergunta nos tirava da zona de conforto. Depois de quase 5 anos de muito trabalho mas sem um foco claramente definido, a ideia deste projeto assinalava todas as “check boxes” das nossas aspirações profissionais e aspirações para o Surfari como empresa/comunidade/produtora. Em uma autoanálise empresarial o Surfari retratava a vida de surfistas “geeks” de média/baixa performance e nossa principal contribuição para o mercado era entregar conhecimento, informação e entretenimento. Precisávamos ir em busca de novas respostas para uma cultura que estava aflorando rapidamente no Brasil. Nossa pergunta norteadora da pesquisa era: qual a identidade do surfista brasileiro?


Só que para entrevistar surfistas por toda a costa do Brasil, precisávamos de dinheiro. O Surfest tinha nos alçado em um novo patamar de visibilidade mas por outro lado, tinha zerado nosso - já debilitado - caixa. O crowdfunding surgiu como uma saída interessante que poderia unir investimentos tanto de marcas (PJ) como de nossos seguidores (PF). Lançamos a ideia no ar em uma grande campanha, com muita ajuda de amigos e entusiastas.


Pouco mais de 13K foi levantado no crowdfunding e algo em torno de 40K junto à marcas variadas, entre elas: Mitsubishi, Mormaii, Rip Curl, PowerLight, GoFlow…. Corona nos deu muita cerveja que logo ali (depois de uma festinha para os solteiros no dia dos namorados batizada de “Love-me Livre”) se transformou em dinheiro. Vendemos uns equipamentos, fizemos mais uns vídeos institucionais e partimos para um primeiro teste rumo ao Chuí. Voltamos para a base e depois fomos até Torres e Garopaba. Retornamos mais uma vez e dividimos o conteúdo captado com a equipe. Desde o início percebemos que o projeto tinha muito potencial e para nossa surpresa, a recepção das pessoas para as entrevistas era muito boa.


Dar voz e tempo a pessoas que nem sempre tem o espaço e para expor as suas ideias é uma experiência transformadora.


Planejamos nossa ida definitiva, rumo a três meses de estrada e fomos. O miolo dessa viagem/pesquisa/projeto/aventura tem tanta história que não cabe por aqui. A parte registrada está espalhado pelo Youtube e já tem mais de 1.348.900 views. Já dá pra dizer: MILHÕES DE VIEWS! Kkk


O #reconhecedosurf é um projeto que transcendeu a empresa e inspirou muita gente a surfar, cumprindo nosso grande lema “se mais pessoas surfassem o mundo seria um lugar melhor”. É o troço que eu mais me orgulho de ter feito na vida. Algo que me acrescentou muito como pessoa e acredito que plantou sementes boas na sociedade. Fica o meu agradecimento eterno as pessoas que ajudaram a tirar esse sonho do papel: Guilherme, Paulo, Andreia, Bolivar, Martim, Lee, 303 DesignSquadron, Herbert… e é claro, às centenas de entrevistados(as) que deram rostos e vozes para essa história.


Sim, ainda tem coisa pra sair da viagem. Coisas que eu já prometi colocar no ar, mas nunca consegui. Porque? Não sei.

Tem livro, tem filme, tem mais 2 episódios na série do Youtube. Quando postaremos? Não faço ideia. Aproveito para pedir desculpas aos nossos seguidores mais fiéis que esperam ansiosamente pela notificação no Youtube. Existe um bloqueio grande neste que vos escreve por alguns motivos óbvios que virão à tona nos próximos capítulos dessa retrospectiva de 10 anos. E, escrever é justamente uma ferramenta que tenho usado para tentar desbloquear alguns caminhos. Seguimos!


PARTE 7/10





2016 encerrara de maneira épica mas também melancólica. Para conter os custos do nosso caixa pós o combo Surfest +ReconhecendoSurf tivemos que abandonar o aluguel do Studio Floresta e dissolver a equipe. Paradoxalmente, nosso sentimento com o Surfari era muito otimista. A viagem pela costa tinha nos conectado com o Brasil todo e por isso, decidimos estar mais centralizados geograficamente e nos mudar para o Rio de Janeiro.


Nosso novo apartamento-estoque-escritório-ilha de edição (que tinha um custo-benefício meio fora da realidade carioca), era grudado na saída do canal da Barra da Tijuca, em frente ao Quebra-mar. Nosso quintal tinha não somente vista para o mar, mas também acesso direto ao oceano por uma rampa de barcos no subsolo, numa espécie de batcaverna do surf. Bem verdade que por metade do dia, a maré seca transformava o Tahiti no Tietê. “Para quem não tinha nada, metade era o dobro”.


Entre festivals Mimpi, festas do Canal Off, shows do Gelpi, encontros na casa Comprancha e novos relacionamentos amorosos que nos deixavam com brilho no olho, estávamos desbravando um novo mundo em que o surfe era tão comum quanto atravessar a rua, ou andar de elevador. Nosso conceito Surf+Safari estava em cheque, mas não deu muito tempo pra gente se preocupar com isso.


Collabs de produtos estavam sendo desenhadas, ideias de eventos surgiam na nossas cabeças e os episódios do Reconhecendo o Surf vinham fazendo um certo sucesso na internet. Ah.. e o carnaval chegava chegando.


Pós semana de carnaval estávamos finalmente trabalhando. Zuch, empenhado em completar uma planilha de excel gigantesca chamada CONTATOS DA VIDA.xls recheada com todas as pessoas que ele conhecera na viagem + contatos profissionais + amigos + frequentadores dos nossos eventos + clientes das nossas roupas e por aí vai…


Nas colunas dessa lista: os telefones, emails, conexões, empresas, arquétipos do RecSurf…


O mar estava fraco, as ondas desorganizadas. Mas era só esticar o pescoço da mesa de trabalho para dar aquela conferida. Zuch feliz demais para focar nesse tal excel. Realizado profissionalmente, feliz com a família, com a namorada e com a realidade que tinha criado para si. Um surfista de média performance que há 5 anos atrás vestia um terno na Av. Carlos Gomes, agora acessava o mar pelo seu quintal e estava vivendo do surf. Estava completo. Foi surfar pra comemorar. Foi surfar para sempre.


Sem entrar muito nos detalhes do dia do acidente, o 7 de Março de 2017 foi um antes e depois na vida de muita gente. A angústia da espera, o peso da notícia, o aviso para a família, a força tarefa que ajudou nos dias de coma, a linha tênue entre a esperança e o desespero… A intensidade desses momentos deixam marcas profundas na nossa memória e cada ano que passa, esses episódios do passado ganham outros significados de acordo com o que estamos vivendo no presente.


É uma espécie de passado mutável, não definido. É por isso que é tão difícil escrever ou terminar um vídeo que toquem neste assunto. Parece que criando esses registros, estamos concretizando um pensamento de ainda frágil definição.


Tudo parece imaturo, não finalizado.


Naquele ano em especial, desde o primeiro dia do acidente em diante, fizemos de tudo para afastar o sentimento de luto e transformar aquela experiência da passagem de Lucas em algo mágico. Mas o luto é implacável. A falta que um cara com o potencial dele faz na terra é gigante e a tristeza às vezes vem à galope.


Lutamos tanto celebrar essa despedida de peito aberto e queixo erguido, que em alguns momentos somos golpeados pela realidade trágica dos fatos com a guarda totalmente aberta.


E, talvez essa seja mais uma coisa que ainda está muito imatura para ser escrita. Mas daí azar, às vezes escapa


Incrível que em 2017 ainda concluímos alguns projetos comerciais, colocamos de pé o SURFEST LUZ na praia da Silveira, fizemos uma LOJINHA no @ceubarearte e iniciávamos um filme lindo chamado VINTESETE. Tudo isso amparados por uma força divina, chamada AMIZADE.


PARTE 8/10




Chegamos em 2018.


A situação que Zuch deixou o Surfari em 17 era bem boa. Um caixa positivo, um projeto de sucesso em andamento (reconhecendo o surf) e o primeiro contrato de fee mensal para produção de conteúdo para uma marca (Mormaii)

A base era boa para continuar fazendo do Surf-Safari um projeto de vida mesmo que pensamentos contrários viessem à mente o tempo todo.


Com a nova estrutura administrativa e operária de um homem só (somado a vários amigos e parentes ajudando no amor), naturalmente a empresa começou a atuar cada vez mais como uma produtora audiovisual. Também, como o acidente de Lucas foi uma notícia bem comentada no meio do surf, uma inédita visibilidade pairava agora sobre o nosso trabalho. Nosso Instagram, página de Facebook e YouTube haviam ganhado novos e curiosos seguidores.

Um jovem mercado em torno das redes sociais começava a se aquecer e cada vez mais. E, ao meu lado, minha namorada que já trabalhava no ramo vinha me mostrando alguns caminhos para rentabilizar produção de conteúdo em parcerias com marcas. Lembrando que estamos de 2018 e termos como “digital influencer”e ”publipost” ainda vinham sendo cunhados.

Nesse ramo, unimos nossas forças e alcançamos um antigo sonho de ganhar uns pilas para viajar. (Sri Lanka, Uruguai, Sul do Brasil). Só que nesse mundo novo, em que “likes”, “comments”, e “shares” passavam a ter uma maior importância na direção criativa, o Surfari agora deixava de entrevistar figuras pitorescas do Oiapoque ao Chuí e andava numa estética bem mais mais “Love is in the air.”


Pensando bem, nada mais sincero naquele momento.

Lembro de conversas com amigos em que manifestei a pressão que eu colocava em mim mesmo para dar continuidade ao legado do Zuch, tornando o Surfari uma marca relevante e enriquecedora para a cultura surf. Em contrapartida, eram tempos em que as pequenas felicidades à curto prazo - distantes de grandes missões altruístas - eram um curativo muito mais eficaz para me levar adiante.

E, se tem um lugar bom para proporcionar felicidades de curto prazo, esse lugar é o Rio de Janeiro. Entre mates e dias de praia intensos com um grupo de amigos mais do que especial, novas histórias iam surgindo e deixando a vida leve novamente.

Nossa base continuava sendo a rua Presciliano da Silva 140. Encravado nas rochas do Joá, pendurado acima do encontro do canal da Barra com o oceano atlântico, acesso privilegiado para as ondas do quebra-mar (nosso quintal proibido), dotado de piscina, churrasqueira e um por do sol que caprichosamente nos meses de verão, caia no mar e jogava seus últimos raios alaranjados para dentro da nossa sala de estar/escritório. Paradoxalmente, a mesma vista que encantava, lembrava a todo momento o exato lugar em que Lucas partiu para sempre. Ali, onde o sol cegava a vista com seus reflexos, naquele onda ali.. quebrando dourada… e se eu tivesse olhando o entardecer naquela hora? E se eu tivesse surfando junto aquele dia?

Pensamentos assim eram inevitáveis, mas aquele apê se tornou um grande QG dos amigos gaúchos de passagem pelo Rio, e a cada por do sol a negatividade era varrida por ondas de risadas (regadas por coronas com limão, marca que passei a trabalhar cada vez mais.)

Naquele ano, durante a etapa da WSL em Saquarema, hospedei pela segunda vez uma dupla de gringos da revista Stab, que estava produzindo uma série chamada No Contest, retratando tudo que se passava no campeonato, quando não estava “On”. Acabaram me chamando para algumas diárias de filmagem, subimos a rocinha para doar umas pranchas, registramos as peculiaridades do local e entrevistamos o @foamballunicorn. Também levamos a turma toda da Red Bull e da Jeep para uma das festas que a Larissa, minha companheira, tocava como Dj. Esses dias intensos de contato renderiam muitos trabalhos nos anos seguintes.

Aos poucos os parceiros músicos que o Surfari tinha em alguns projetos em Porto Alegre também foram se mudando para o Rio. A cidade parecia ter uma aderência muito maior para quem trabalhava com artes, sejam elas visuais ou sonoras. Também, a farra precisa de música e, a capital carioca é um daqueles lugares do mundo que é possível viver (e morrer) apenas de farra. Não era meu plano.

Projetos comerciais audiovisuais revezavam-se com alguma coisa autoral. E assim, o barco andava. Dia após dia, de grão em grão, recomeçando algo que já existia, mas nunca mais seria o mesmo, nem se eu quisesse.

Novos amigos, novas histórias e novos horizontes.

Naquela fase a felicidade, que era o plano principal, estava sendo atingida com sucesso e, o O Surfari seguia de pé norteando a caminhada.



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